O sebo e o divã
André Falcão de Melo Filho*
Há anos atrás, eu tinha uma prática semanal e solitária. Ia para algum sebo e ficava procurando livros antigos e, de preferência, que já estivessem esgotados. Parecia que eu estava buscando algum tipo de verdade escondida, que já não poderia ser veiculada nas grandes livrarias. Achava que a maioria dos livros de autoconhecimento e autoajuda procurados pelo grande público não guardariam uma relação com as verdades íntimas de cada um. Apenas fala vazia e blá-blá-blá…
Voltando aos sebos, parecia que era naquele lugar — calorento, com cheiro desagradável de mofo e tanta poeira que me causava alergia — que residia algo que eu pudesse ler de diferente. Acredito que a psicanálise também tenha me fisgado por isso; falar e ouvir coisas diferentes do que já haviam me dito.
Recentemente, quando estava viajando, passei por um sebo e não senti a menor vontade de entrar. Estranhei, divaguei por um tempo… até que percebi que, na realidade, eu não precisava mais. Continuo lendo histórias — antigas, exclusivas e esgotadas — quase todos os dias, daquelas que as endereçam a mim, e por mais que às vezes visitemos lugares fedorentos e desagradáveis, há um estranho contágio que se adquire, um desejo de saber de si. E para alguns, dos outros.
*Psicanalista membro FCL Alagoas
stylete lacaniano, ano 9, número 27,